Texto abre exceção para quando 'condições sanitárias' de estados e municípios impedirem retorno às salas de aula. Deputados ainda analisam trechos antes de enviar texto ao Senado. A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (20) o texto-base de um projeto que proíbe a suspensão das aulas presenciais durante a pandemia de Covid.
O texto torna as aulas presenciais "atividades essenciais", mas abre exceção para quando as condições sanitárias de estados e municípios não permitirem o retorno, "com base em critérios técnicos e científicos devidamente publicizados".
Segundo o projeto, essa situação sanitária deve ser explicitada em ato do poder Executivo local. A proposta não deixa claro quais seriam esses critérios técnicos e científicos. Opositores afirmam que o texto é "subjetivo" e fere a autonomia de estados e municípios.
Para a conclusão da matéria, os deputados ainda precisam analisar os destaques, que são sugestões de alteração no texto. Em seguida, a proposta vai ao Senado.
Pelo projeto, a educação básica e de ensino superior em formato presencial, nas redes públicas e privadas de ensino, serão consideradas serviços e atividades essenciais mesmo durante enfrentamento de pandemia, emergência e calamidade pública.
UM ANO DEPOIS: Estudantes e famílias ainda enfrentam incertezas com reabertura das escolas na pandemia
BANCO MUNDIAL: Escolas fechadas poderão afetar leitura de 7 em cada 10 estudantes do Brasil
ÃPICE DA PANDEMIA: 'Não é seguro reabrir escolas em meio à catástrofe no Brasil', diz pesquisador
Volta às aulas: programa do G1 tira dúvidas sobre o tema
Na semana ada, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) emitiu posicionamento contrário à proposta, em que defende que "cada gestor estadual ou municipal possa avaliar com as autoridades sanitárias locais a situação epidemiológica na tomada da decisão de manter ou não as aulas presenciais".
“Não é o momento de obrigar estados e municípios a abrirem suas escolas, numa decisão única para todo o país”, diz a nota.
Mesmo com alterações feitas pela deputada relatora Joice Hasselmann (PSL-SP) – que incluiu no parecer diretrizes para o retorno presencial –, o Consed manteve a posição contrária ao texto.
O projeto
Segundo a proposta, a estratégia para o retorno às aulas presenciais deve ser elaborada em colaboração entre os entes federados, que devem respeitar as orientações do Ministério da Saúde.
O texto prevê que os sistemas de ensino podem adotar estratégias como rodízio de turmas e adoção de sistema híbrido, com atividades pedagógicas presenciais e não presenciais.
VÍDEO: Entenda o que é o ensino híbrido
Também está prevista a possibilidade de os profissionais do grupo de risco para a Covid ou que morem com pessoas do grupo de risco serem liberados das atividades presenciais. Para isso, as escolas devem definir "formas pactuadas de trabalho".
Ainda segundo a proposta, os pais ou responsáveis pelos alunos de quatro a 17 anos podem optar “excepcionalmente” pelo não comparecimento nas aulas presenciais enquanto durar a pandemia e se os alunos ou familiares estiverem no grupo de risco, "desde que devidamente comprovado".
Neste caso, as escolas devem proporcionar atividades não presenciais para o acompanhamento do currículo escolar.
O projeto diz, ainda, que o calendário de retorno às aulas não precisa ser unificado, o que permite datas e ritmos diferentes para cada uma das escolas, a depender do local.
Diretrizes para o retorno
O parecer aprovado pelos deputados também prevê que o retorno às aulas presenciais deve seguir algumas diretrizes:
critérios epidemiológicos para a decisão sobre o funcionamento das escolas;
prioridade na vacinação de professores e funcionários das escolas;
prevenção ao contágio de estudantes, profissionais e familiares pelo novo coronavírus;
igualdade de condições de o ao aprendizado;
equidade para o estabelecimento de prioridades na alocação de recursos e ações voltadas ao retorno às aulas;
participação das famílias e dos profissionais da educação;
parâmetros de infraestrutura sanitária e disponibilização de equipamentos de higiene e proteção, como máscaras, álcool em gel, água e sabão;
parâmetros de distanciamento social e prevenção;
avaliação diagnóstica de aprendizado e ações de recuperação;
critérios para validar atividades não presenciais quando as aulas presenciais forem suspensas, sem prejudicar os alunos que não tiverem o frequente aos meios tecnológicos de comunicação.
Volta às aulas presenciais exige cuidados
Discussão
As diretrizes para o retorno às aulas presenciais, incorporadas no relatório de Joice Hasselmann, eram listadas em outro projeto de autoria do deputado Idilvan Alencar (PDT-CE), que tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.
A oposição e a bancada da educação na Casa defendiam a votação deste projeto, que tem a relatoria dos deputados Orlando Silva (PCdoB-SP) e Professora Dorinha Seabra (DEM-TO). A principal diferença entre eles é que o outro projeto, que tramita na CCJ, não fala em proibição da suspensão das aulas presenciais.
“Reconheço que é um tema difícil, que envolve até mesmo segurança alimentar das crianças e saúde mental. Mas é preciso muito cuidado diante da realidade que vivemos”, diz Orlando Silva. “[O projeto aprovado] Fere, inclusive, a autonomia dos entes da federação, quando deveria ter um esforço ao contrário.”
Parlamentares críticos à matéria argumentam que o texto coloca professores e alunos em risco no pior momento da pandemia. Além disso, na avaliação desses deputados, o trecho que define a essencialidade da educação pode retirar o direito dos professores de fazer greve.
“Este não é o 'projeto escola aberta, é 'escola contaminada'. Esse projeto não trata da educação como essencial. Esse é um argumento enganoso, uma falácia, um sofisma”, disse a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).
O líder da Minoria na Casa, Marcelo Freixo (PSOL-RJ), disse que a Constituição já define a educação como essencial e que, para isso, deveria ser garantido às escolas serviços como internet, água potável, condições sanitárias, vacinação e testagem dos profissionais.
“A essencialidade tem que ser dada com direitos, com condições sanitárias adequadas, que não estão garantidos na prática”, disse.
Já os que defendem a matéria dizem que colocar a essencialidade da educação em lei nacional garante um direito aos alunos.
“O que queremos com este projeto é simplesmente que o direito à educação das nossas crianças, dos nossos adolescentes, seja respeitado”, argumenta a deputada Adriana Ventura (NOVO-SP), uma das autoras do projeto.
Segundo o líder do PV, Enrico Misasi (SP), o projeto não obriga o retorno às aulas, já que é necessário seguir critérios científicos para a educação presencial. "[O projeto] É prudente ao dar uma válvula de escape para, em caso excepcionalíssimo, suspender a aula presencial", diz.
A deputada Aline Sleutjes (PSL-PR) disse que “professores que colocarem em discussão o fato de não quererem voltar [às aulas] porque não chegou ainda a sua vez na vacina estão negando a sua essência enquanto defensores da educação”.
“Professores já estão qualificados para receber a vacina, mas não podem associar esse motivo para voltar ou não às escolas”, disse.